segunda-feira, 17 de abril de 2017

“… Homem e mulher os criou…”



No nosso último texto, entendemos porque devemos retornar ao “princípio”. Os fariseus ao interrogarem Jesus a respeito da unidade e indissolubilidade do matrimônio (Mt 19) vão até Moisés para justificar suas atitudes. Cristo, porém, vai além e os reconduz ao princípio no plano da criação narrado no livro do Gênesis. Cristo mostra que o próprio profeta apenas permitiu a carta de divórcio por causa da dureza dos corações, mas, continua Ele, no “princípio” não era assim. Os fariseus parecem convictos ao afirmarem seus fundamentos, mas Cristo vai às origens, e não permite que a discussão fique apenas no âmbito legalista. Mais uma vez Ele apela para que o coração endurecido do homem seja transformado.
No diálogo com os fariseus, Jesus menciona duas passagens do livro do Gênesis. O primeiro questionamento é: “Não lestes que desde o princípio o Criador os fez homem e mulher? ”. Este tema é tratado em Gn 1,1 – 2,4, que relata a criação em sete dias. Esta narração, denominada de eloísta, porque provém da nominação de Deus como Eloim, apresenta estrutura teológica com fortes implicações metafísicas e éticas. O traço teológico é percebido ao não se comparar o homem com qualquer outra criatura, mas apenas com Deus: “Deus criou o homem a sua imagem, à imagem de Deus ele o criou”. O relacionamento da criatura com o criador é privilégio do homem, e só dele. Logo, o homem não pode ser reduzido ao “mundo”, às outras obras da criação, tanto que o próprio Deus ordena que subjugue e domine sobre a terra. E, ainda vai além, depois de os abençoar, dizendo que sejam fecundos e se multipliquem. Assim, este primeiro texto é direto e objetivo ao tratar da criação do homem e da mulher, e da unívoca relação entre eles.
No mesmo diálogo com os fariseus, Jesus faz menção à segunda passagem do Gênesis: “Então, o homem deixará pai e mãe, se unirá a sua mulher, e os dois serão uma só carne”. Ela corresponde a Gn 2, 4 – 25. Este texto é conhecido como javista, pois refere-se ao tratamento de Deus com Javé (Iahweh), cujas características antropomórficas são marcantes, como por exemplo “plasmou” o homem, “insuflou” em suas narinas. Essa narração apresenta característica subjetiva, psicológica, pois o homem chega à autoconsciência ao conhecer o mundo, e ao autoconhecimento quando se descobre como pessoa. O texto javista traz os ensinamentos da nudez original (“…estavam nus…), da inocência original (“… e não se envergonhavam…”) até chegar à arvore do conhecimento do bem e do mal, que leva o homem ao pecado original, ao seu estado de pecaminosidade.
Mergulhando na realidade da criação, Deus nos mostra a beleza da complementariedade do homem e da mulher. Ao afirmar que os dois serão uma só carne, Jesus mostra a grandeza e a profundidade desta união indicando como caminho único possível para que ela reflita a imagem e semelhança de Deus. O homem foi criado para a mulher, e a mulher foi criada para o homem. Tanto que, no texto javista, ao declarar que “não é bom que o homem esteja só”, Deus cria a mulher para ser a companheira do homem. Deus não cria um objeto, um animal ou mesmo outro homem, mas cria a mulher (“carne da minha carne, ossos dos meus ossos”) para ser a complementação ideal para o homem.
Homens e mulheres não são simplesmente diferentes, mas distintos. A diferença pode levar até mesmo à contradição, mas a distinção leva à complementariedade. E é exatamente desse caráter complementar – que envolve a pessoa por inteiro, corpo e alma – que vem a beleza do dom recíproco de si, capaz de procriar, de gerar nova vida.
Assim, Cristo reafirma seu convite para que o homem possa voltar e viver a sua inocência original, mesmo que a tenha perdido, assinalando que o caminho começa pelo coração puro do princípio.
(Texto: Tatiana e Ronaldo de Melo)
Fonte: https://teologiadocorpoarqrio.wordpress.com/2017/04/12/homem-e-mulher-os-criou/

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